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Interpretação das Escrituras Sagradas Gera Conflitos nas Religiões

Por : Xisto Fernando

No início da noite de 27 de Julho do ano em curso, com a cidade de Maputo a ressentir-se do frio que sempre se repete neste inverno, a Fundação Fernando Leite Couto (FFLC), abria as portas para receber mais um atelier filosófico com o tema “As interpretações das escrituras sagradas”, sob moderação do filósofo moçambicano Severino Ngoenha e, tendo como oradores  Esidine Mecupe, que se ocupou em falar do Alcorão (livro sagrado para os muçulumanos) e Samuel Ngale, convidado a usar sua eloquência para falar da Bíblia ( livro sagrado para os cristãos).

Severino Ngoenha e Esidine Mecupe

A noite foi de muito entusiasmo, com uma plateia composta maioritamente por jovens, o que é raro neste tipo de debate. Pensamos nós que esta afluência juvenil, deve-se a pertinência do tema ora tratado, afinal de contas a interpetação das escrituras sagradas possui diversas abordagens e gera vários conflitos, arriscamos dizer que se hoje as religiões são intolerantes, umas com as outras, ou se hoje  nascem muitas igrejas e seitas, deve-se ao problema de interpretação dos livros sagrados, como diz o dito popular, “ cada um puxa a sardinha para sua brasa”.

Conforme afirmou Severino Ngoenha, no momento introdutório do debate, o grande problema das religiões actualmente reside na interpretação do que está escrito. “ o que temos vindo a ouvir,  a discutir, e a observar nos últimos tempos, é que muitos dos conflitos que nós temos nas nossas religiões de referência, são intresincamente ligados a interpretação”.

Um dos exemplos deste problema de interpretação revela-se na palavra “Jihad”, que é um termo valoroso da religião islâmica, que siginifica, empenho, esforço ou luta, no entanto dando ao problema de interpretação, actualmente esta palavra tem sido entendida como a guerra santa travada contra os inimigos da religião cristã. Um exemplo frontal desta tese, é a guerra de Cabo-Delgado, que é atribuída aos Jihadistas e apelidada por terrorismo islâmico. Porém, durante o debate a visão de existir um terrorismo islâmico foi descartada, afinal isso também incorreria a existência do terrorismo cristão, terrorismo budista, quiça chamarmos de forma mais ampla, “terrorismo das religiões”.

“Nunca vamos ter um critério interpretativo, uma hermenêutica exacta, uma exegese plausível, vamos ter sempre percursos, caminhos mais ou menos certos”, sublinhou Ngoenha. Acrescentando que no dia que termos uma interpretação perfeita seremos quase deuses.

Ainda no diapasão da interpretação, Severino Ngoenha afirmou que qualquer livro, mesmo a Bíblia e o Alcorão, são suspectíveis de serem apreendidos de uma maneira desonesta, o que acaba provocando o conflito na interpretação.

Samuel Ngale incumbido de falar sobre a Bíblia preferiu começar o seu discurso, falando da importância da interpretação, em diferentes contextos. “Mesmo entre diferentes culturas, a questão de interpretação é absolutamente fundamental, quando se interpeta mal uma mensgem de uma vizinho, pode haver ruído”, afirmou Ngale.

Ainda segundo Ngale, inicialmente a interpretação não era para as sagradas escrituras, mas sim para arte, e para questões ligadas a estética, como poesia e outras formas de arte, tendo evoluído até o seu uso em discursos, resflorecendo também na oratória.

Samuel Ngale

O orador definiu a interpretação no Cristianismo como sendo longa, vasta e tortuosa, por ter uma história de milhares de anos. No século 20, segundo Samuel Ngale, surgiram duas escolas distintas, que são os “Literalistas” e “Alegoristas”.

“Os Literalistas querem abraçar a ideia de que a Bíblia, ela já é clara o suficiente para qualquer leigo ler, que não precismos de alegorias ou qualquer outra coisa, só temos que ir a Bíblia e tomar como lá está”, explicava Ngale.

Os Literalistas nunca souberam explicar com exactidão a sua escola, bem como os escossistemas presentes na Bíblia, o que abriu uma brecaha para os Alegoristas, surgindo com uma tese mais ou menos convincente, que sugere um olhar sobre a moral da história, os significados escondidos na Bíblia, uma vez que as escrituras sagradas não são tão evidentes como muitos pensam.

“Tanto no antigo e novo testamento , particularamente nos evangelhos há muita ilustração e alegoria, aqueles ensinamentos de sementes que crescem para serem mostarda, tudo isso tem significado por detrás”, enfatizou Ngale.

A interpetação das escrituras sagradas, muita das vezes é usada para legitimar um ponto qualquer, “por exemplo, há quem está usar termo jihadista, e para que fim está usa-lo para legitimar uma violência em qualquer sítio.

Por sua vez Esidine Mecupe, referiu que o Islão tem o Alcorão como a palavra genuína de Deus, sem interferência ou manipulação do Homem e, tem a Suna, que é um livro sagrado que contém os ditos de Maomé.

Na Cultura árabe, a palavra Suna tem o significado literal de “caminho trilhado”, ou seja as verdades que foram seguidas pelo profeta, das quais surgiram suas tradições. A Suna apresenta também um significado terminológico que indica que todas as aprovações, dizeres e realizações de Maomé em mais de vinte anos como mensageiro divino, assim tudo que envolve a sua vida forma a Suna, que deve ser praticada e seguida pelos muçulumanos segundo as tradições.

Parte da plateia

“Normalmente, as pessoas dizem que o Alcorão é a Bíblia dos muçulumanos, mas eu digo que não, porque a bíblia é semelhante a Suna, pois tem contos sobre Jesus contados por pessoas, é o mesmo que acontece com a Suna”, explicava Mecupe, acrescentando que o alcorão é diferente da bíblia, porque é só a palavra de Deus.

Segundo Esidine Mecupe, a interpretação das escituras sagradas, gera conflito quando é cortada  da fonte principal, quando surgem pessoas que acham que podem interpretar melhor em relação a aquele pessoa dada esta missão por Deus.

Mecupe considerou que no Islão há linhas próprias de interpetação, mas nem todos seguem esta linha de interpretação, a exemplo dos que são chamados de terroristas islâmicos, “eles podem ser muçulumanos, mas a acção deles não os torna, não é pelo facto de usarem turbante, há regras”, acrescentando que para um acto ser muçulumano deve estar de acordo com as fontes do Alcorão e a Suna.


 

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