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Cinco poemas de Malangatana

Malangatana Valente Ngwenya nasceu em Matalana, distrito de Marracuene, 6 de junho de 1936 e morreu em Matosinhos (Portugal) em 5 de janeiro de 2011. Foi um artista plástico e poeta moçambicano, conhecido internacionalmente. Produziu trabalhos em vários suportes e meios, desde desenho, pintura, escultura, cerâmica, murais, poesia e música.

Leia a biografia detalhada de Malangatana clicando aqui

Malangatana
I
A CORUJA

A coruja agoira-me
e diz-me que nunca chegarei
além onde o desejo me leva
e assim evapora-se o sonho;

O tambor foi tocado
na noite densa do feitiço
enquanto Kokwana* Muhlonga
apitava o Kulungwana* mortal;

Na noite sem estrelas
dois gatos pretos iluminaram
a cabana da Kokwana Hehlise
que morreu depois dos gatos terem miado.

Eu lutando comigo só
é impossível vencer as ondas
que feitiçeiramente me esboçam
as corujas, gatos e tambores.

obra de Malangatana


II
EXPOSIÇÃO 

As negras das lagoas
fazem exposição
de quadros nús e tristes
com os próprios corpos as artistas
pintam no fundo da parede de caniço

É uma exposição permanente
e uma galeria de quadros humanos
que se vendem na galeria livre
uma galeria mais que pública
inaugurada pelo primeiro que chegou

Os quadros adquiridos
são pagos no quarto da negra
depois de oferecer a sua carne
e o adquiridor nunca leva o seu quadro
fica para o outro Paraquedista


obra de Malangatana

III
PENSAR ALTO

Sim
às marrabentas
às danças rituais
que nas madrugadas
criam o frenesi
quando os tambores e as flautas entram a fanfarrar

fanfarrando até o vermelho da madrugada fazer o solo sangrar
em contraste com o verdurar das canções dos pássaros
sobre o já verduzido manto das mangueiras
dos cajueiros prenhes
para em Dezembro seus rebentos
dançarem como mulheres sensualíssimas
em cada ramo do cajual da minha terra


mas, sim ao orgasmo
das mafurreiras
repletas de chiricos
das rolas ciosas pela simbiose que só a natureza sabe oferecer

mas sim
ao som estridente do kulunguana
das donzelas no zig-zague dos ritos
quando as gazelas tão belas
não suportam mais quarenta graus à sombra dos canhueiros em flor

enquanto as oleiras da aldeia, desta grande aldeia Moçambique
amassam o barro dos rios
para o pote feito ser o depositário
de todo o íntimo desse Povo que se não cala disputando
ecoosamente com os tambores do meu ontem antigo.


obra de Malangatana

IV
A MAMÃ PREOCUPADA

Nos teus braços eu fiquei
quando me nasceste muito preocupada
quem estava aflita
naquela altura perigosa
com o receio de que Deus me vai levar?

Tudo em silêncio olhava
para ver se o parto corria bem
tudo lavava as mãos
para poder receber quem vinha dos Céus
e toda a mulher quieta e aflita

Mas quando afastei-me
do lugar em que me guardaste durante longo tempo
dei logo o primeiro respiro
tu gritaste logo de alegria
o primeiro beijo foi o da Avó

Que levou-me logo para o lugar
que me guardaram e é secreto
tudo foi proibido a entrar no meu quarto
porque tudo cheirava mal
e eu todo fresco, fresco
respirava finalmente dentro das minhas fraldas

Mas a Avó que se supunha doida
estava sempre ao meu lado
ver-me e rever-me sempre
porque as moscas vinham ter comigo
e os mosquitos inquietavam-me
Deus que revia-me também
era o amigo da minha Avó velhinha


obra de Malangatana
V
AMOR VERDE

Porque o amor não é sempre verde
que bom quando verde é
nem quero que mudes de cor
ó amor verde, verde, verde
ele é tão bom, bom, bom

Na cama quando passei a primeira noite
senti-me feliz quando corria dentro dela
a lágrima que nos fez amigos infinitos
porque dela veio quem nos chama: Papá e Mamã
o nosso primeiro filho, tão lindo, lindo.



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