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“João Timane” O artista que retrata o quotidiano

João Timane

Obra:Milena

João Timane mostrando suas obras

Construção 
Ele vive naquela zona por onde os aviões passam por perto, como se estivessem para cair, mas é ilusão, aqueles monstros metálicos não caem no subúrbio. Na sua infância, sonhava em ser jogador de futebol e, por incrível que pareça, era o melhor da zona, fintava e marcava golos como ninguém. No entanto, o movimento giratório da vida fê-lo mudar de sonhos, o de jogador para artista plástico, embora antes tenha sido rejeitado por causa da sua tenra idade, já que nascera a 5 de Dezembro de 1991. Porém, hoje, João Timane é aclamado nas galerias. Desde o início da sua carreira, até os dias que correm, já realizou exposições dentro e fora do país, tendo como inspiração o quotidiano.
A Massala Arte teve o privilégio de conversar com Timane, que nos abriu as portas da sua humilde galeria, situada no bairro Aeroporto “A”, na cidade de Maputo, onde nasceu, cresceu e vive até hoje.
Mssala Arte (MA):  Quem é João Timane?
João Timane (JT):  Como pessoa, sou jovem, pai de família, marido e artista.
MA: Como foi a sua Infância?
JT:. A minha infância foi marcada pelo futebol, pratiquei-o bastante que fui um dos melhores jogadores que o meu bairro teve. Tinha futuro na bola, contudo tive que deixa-la por causa da escola, pois me era difícil conciliar as duas coisas. Além de jogador de futebol, fui dançarino de street dance, na altura em que a maioria dos jovens do bairro estava na dança e alguns envergaram pelo basquetebol.
MA: Quando começa a entrar no mundo das artes plásticas?
JT: Entrei no mundo das artes sem planos, foi do nada. Quando fiz a décima classe, tive duas disciplinas em atraso. Em vez de ficar em casa, o meu primo, Timóteo Bila, aconselhou-me a estudar artes visuais, na Escola Nacional de Artes Visuais (ENAV). Não tinha outra opção, segui este caminho. Na verdade, foi uma surpresa para mim quando o meu primo levou-me a ENAV para me inscrever, porque eu nem sabia que existia uma escola que ensina a desenhar, isto porque no bairro só existem artistas autodidactas. Quando cheguei à escola, impressionei-me porque nunca tinha visto um desenho feito à mão.
MA: Durante a sua infância, chegou a ter influência do desenho ou foi apenas na fase da juventude?
JT: Na verdade, eu desenhava muito e gostava mais de retratar os desenhos animados que via em canais de televisão e nas pequenas cápsulas de pacotes de “Chips”, que continham imagens de desenhos animados. Por tanto que praticava fui aperfeiçoando a arte.
MA: Quando é que começa a levar as artes plásticas como arte na sua essência?
JT: Foi na primeira exposição dos estudantes da ENAV, em 2011. Na altura, frequentava o segundo ano. Estive com artsitas como Muzilene, Helder Mate e outros artistas que não conseguiram singrar nas artes. Aqueles são os únicos que até hoje se fazem sentir no panorama artístico. Nesta primeira exposição, tive muito sucesso de venda, o que, de certa forma, me motivou porque me fez acreditar que posso chegar longe nesta carreira. Na verdade, o Muzilene foi quem me deu o primeiro empurrão, convidando-me para fazer uma exposição e deu-me directrizes para poder caminhar no mundo das artes.
MA: Qual foi a sua primeira exposição colectiva e individual?
JT: A primeira colectiva foi com o artista plástico Gilberto Muzilene, designado “Despertando Olhares”, na Mediateca do Banco Comercial de Investimentos (BCI). Como estávamos no início da carreira queríamos despertar o olhar das pessoas, de modo a mostrarmo-las que há uma geração de artistas que está a nascer. Depois desta, a direcção do BCI convidou-me para fazer uma individual, em 2013, a qual apelidei “Cartas de um Grão de Mostarda”. Assim intitulei porque foi-me difícil ter espaço, as galerias rejeitavam-me por causa da idade. Mais complicado porque não existia ninguém da minha idade nas artes plásticas. Levava os trabalhos às galerias e eles nem sequer queriam ve-las. No ano seguinte, expus os “Retratos de Mil Gotas de Sonho”. Nesta tive apoio de muitos poetas e jornalistas que me ajudaram a divulga-la.
MA: O que lhe inspira a criar as suas obras?
JT: Eu pintava o quotidiano, principalmente o do meu bairro: como as pessoas se comunicam, interagem, expõem as suas aflições e problemas. No entanto, pinto mais o que vivo. Tenho uma filha de nove meses, que já passou por muita coisa, penso em trazer a história para ser conhecida nas próximas exposições e obras que for a publicar. Mas, basicamente, a minha inspiração vem do quotidiano.
MA: Já fez alguma exposição fora do país?
JT: Em 2016, recebi convite de uma amiga, Fátima Negarão, escritora e residente em Portugal desde 1974, mas nasceu e cresceu em Moçambique. Ela propôs-me que ilustrasse a capa do seu segundo livro. No lançamento da obra, em Portugal, fiz uma exposição individual, na qual vendi todas as obras. Além de Portugal, tenho um convite para o Brasil, era suposto que tivesse ido em Julho de 2017 para fazer duas exposições, uma em São Paulo e outra na Baia. Mas, por causa dos problemas políticos que o país vem enfrentando a  viagem ficou adiada para este ano (2018).
MA: Olhando as artes plásticas no país e fora que ilações pode tirar, será que os artistas são mais valorizados a nível interno ou externo?
JT: A maior parte dos artistas são valorizados no exterior. Eu considero-me sortudo por ser valorizado num país que a arte não é muito conhecida. As pessoas têm-me apoiado muito, vejo isso através das redes sociais e motivação que me é dada nas ruas. Isso, para mim, é uma dádiva, porque sou valorizado no meu tempo e a maioria dos artistas foram valorizados depois da sua morte.
MA: Sente-se feliz pelo reconhecimento que tem ou ainda falta alguma coisa?
JT: Falta alguma coisa, mas com mais trabalho acredito que vou conseguir chegar aonde almejo. Admitamos que a arte é mais valorizada em países desenvolvidos que já superaram a pobreza e cá (Moçambique) é difícil alguém comprar uma obra de arte enquanto em casa tem problemas de infiltração ou nem por isso, por exemplo.
MA: Até agora, qual foi a sua melhor exposição?
JT: Vou tentar não cometer o erro de valorizar a melhor por causa das vendas (risos). Mas a melhor foi a que fiz com Virgílio Tamele em 2015, que se chamava “ O Azul do Indico”.
MA: Em que país sonha em fazer uma exposição?
JT: Estados Unidos da América. Porque é um país que gostaria de conhece-lo e uma das formas de chegar lá é através da arte.
MA. O que podemos esperar de João Timane este ano?
JT: Este ano, em Junho, pretendo fazer uma exposição em homenagem à minha filha, que será uma miscelânea de pintura e poesia, onde cada obra virá acompanhada por um poema. Serão 30 a 40 poetas e por causa do número, as obras terão um tamanho menor, que é para ter estética e espaço na galeria. Também farei uma ou duas exposições no Brasil. Tenho convite para Portugal, mas não queria passar pela terra do fado sem pisar a pátria do samba.
MA: Qual é o seu sonho como artista?
JT: É levar a minha arte até ao mais alto nível. Dar continuidade aos passos de Malangatana, sem precisar trilhar o mesmo caminho que ele.
MA: Defina a arte em uma única palavra?
JT: A arte é “Vida”!

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